Maio de 1977. O vereador Fábio Lucena, líder do MDB na Câmara Municipal, está discursando violentamente sobre as conseqüências nefastas do “pacote de abril”, uma série de medidas draconianas com que o presidente-general Ernesto Geisel manietou o Congresso Nacional:
- A grei que exerce o poder, desde o rei ao palafreneiro, conseguiu que o Senado e a Câmara dos Deputados deixassem em segundo plano a questão econômica. Nem mesmo a decretação dos novos níveis de salário mínimo, em níveis que mal dão, e se assim o forem, para uma cesta de alimentação semanal, nem mesmo esses níveis mereceram a obsequiosa atenção do nosso Congresso.
Baixinho como um anão de Velásquez, o vereador Waldir Barros, líder da Arena, resolve revidar:
- Permite V. Ex.ª um aparte?
Fábio Lucena faz de conta que não é com ele e continua:
- Não que o Congresso tivesse querido descurar desses problemas. Em absoluto, Sr. Presidente, é que uma questão mais alto se alevanta, e é a questão institucional. E o debate sobre a questão institucional deve prevalecer sobre todos os demais. Nós, quando como oposicionistas, cumprimos aqui o nosso papel de divergência, de conflito legítimo com o aparelho de poder, com o Governo, quando nós verberamos a ação militarista, nós não verberamos a conduta do militar. O militar, entregue aos seus afazeres profissionais, em qualquer das armas, merece o respeito e os encômios de toda a cidadania, de toda a nação brasileira. O que nós desejamos na verdade é que, para a conquista do poder, por militar, por civil ou por padres, qualquer que seja o postulante do poder, nós desejamos que ele se submeta à vontade popular, pelo caminho legítimo do banho lustral das urnas.
Waldir Barros volta à carga:
- Sr. Presidente, o orador está fugindo ao debate e ferindo o regimento interno ao não me conceder o aparte...
- V. Ex.ª me desculpe, mas quem está ferindo o regimento desta casa é V. Ex.ª. O regimento interno diz que para solicitar um aparte, o nobre edil deve ficar de pé ao lado do microfone, e V. Ex.ª continua sentado, numa clara manifestação de desprezo pelo orador...
Pego no contrapé, o baixinho Waldir Barros começa a pular feito um desesperado e a gritar a plenos pulmões:
- Eu estou de pé, Sr. Presidente! Eu estou de pé, Sr. Presidente!
As gargalhadas da platéia quase fizeram a galeria desabar com o inusitado da cena. Não houve aparte, claro. Quem manda o cara ser baixinho?
Folclore Político Amazonense, Simão Pessoa.