segunda-feira, agosto 08, 2005
Para o garoto do clipe que acabei de ver
Esqueça esses discos, vá por mim. Eles se espatifarão contra a parede, morrerão espalhados pelo chão, e lá ficarão até que o espasmo da raiva passe, quando já não poderão mais ser consertados. Aí você vai perceber, doloridamente, que eles valiam mais do que ela, até porque você não a ama, você ama a história, essa história de risos, amassos e choros, digna desse drama mal escrito de Montechios e Capuletos - sem o principal, a poesia. Esqueça a mesa de vidro, o aparelho de som na estante, esqueça a própria estante. Eles se perderão, e não poderão dizer-lhe do absurdo de serem alvo do mais intenso e fugaz desespero. Eu garanto, daqui a alguns anos você vai lembrar disso com certo desconforto – misturado a algum prazer, é verdade. Como um cinqüentão, que em segredo sente vergonha daquelas letras dos Beatles, você vai lembrar do choro e da sensação de morte que só os bêbados e adolescentes sentem pelas mínimas coisas. Esqueça tudo isso, porque daqui a algum tempo esse ardor será apenas a lembrança saudosa de um filme de terror, que assustava muito há dez anos, mas que hoje só rende risadas amarelas e críticas técnicas. Esqueça tudo isso, porque você vai viver pra rir de si próprio, e isso não é tão gostoso quanto dizem aqueles livrinhos de conselhos óbvios que você anda lendo pra fugir da tristeza. Acredite em mim, você está ridículo, e só vai perceber isso muito tarde. Acredite em mim, esses discos farão falta, essa paixão é biológica, feito ácido lático, que só dói em músculos mal usados. Não resistirá a dois minutos de desdém. Acredite em mim, vocês não envelhecerão juntos, simplesmente porque crescerão. Poupe essas paredes e esse fígado mal amaciado, porque tudo isso passa. E repito, guarde esses discos, por favor. Eles são o que você vai levar desse transe patético. Tudo bem, exceções são permitidas: se houver algum A-ha ou algum Guns, mire bem ali, ó, naquela parede mais dura, na altura da viga de ferro.