quarta-feira, agosto 11, 2004

Enlatado Made in Brazil

Foto: A Crítica

Quando eu era criança e assistia aqueles filmes e seriados americanos, eu pensava, como todos nós, que os bandidos eram aquela entidade puramente má, com as barbas mal feitas, os sorrisos cínicos e as frases de efeito. Claro, como os seriados eram americanos, os bandidos eram mafiosos chineses, traficantes latinos ou terroristas russos. Agentes do FBI, com seus uniformes impecáveis, suas pistolas em punho e seus distintivos brilhosos eram a personificação do bem.

Agora o seriado está bem perto de mim. Os episódios são apresentados a cada 3 meses e as locações são aqui mesmo. O último episódio inédito foi ao ar ontem. “The Albratoz Operation”. Mas eu me decepcionei, aliás, como tenho me decepcionado sempre. Não houve um tirinho, um “freeze!”, uma frase de efeito, nada. Eu só via aqueles policiais saindo com maletas, malotes e computadores das casas dos bandidos. Com a calma de quem sai de férias com a família, organizando as coisas no carro. Nada, nada mais. Portas abaixo, tiros de advertência, lanchas cortando o Rio Negro velozmente, helicópteros seguindo suspeitos pela Ponta Negra, nada. Acho que a PF tocava a campainha das casas, até. As empregadas deviam ouvir um “O dono da casa está?” e ir chamar a patroa pra atender as visitas.

Nossos bandidos não precisam de armas, de dentes podres, de sotaque estrangeiro. Não precisam ser molestados quando crianças ou ter padrastos cruéis. Nos roubam da mesma forma com que são presos, como se saíssem de férias, guardando valises com o nosso dinheiro no porta-malas do carro. É tudo tão marasmódico, tão simples, tão triste... Ninguém se incomoda, ninguém os aponta na rua, ninguém os chama de “filho da puta”, como se faz com gente que anda na faixa correta da rua. Há até uma admiração, um fascínio pela figura do bandido brasileiro. Os homens o apontam, sim, como se tivesse o maior pinto, que come quem quiser, como o único da cidade que tem o último modelo da Aston-Martin, o dono do maior iate da marina. As mulheres também. Dizem até ver um charme naquele político passional, que pode ter tudo e todos, mas que sua suas camisas pólo feito um estivador, fazendo galanteios à nossa burrice nos palanques da periferia. Aqui é assim. Não há o risco de se ser baleado, perseguido, humilhado por enxames de repórteres. Aqui não há contas secretas, conexões com a máfia siciliana, com a Yakuza, com o Cartel de Cali. Dois milhões estão lá, em espécie, verdinha sobre verdinha, guardados nos cofres das mansões. Chegam em maletas, em sacolas, nos carros dos bandidos. Saem em maletas, em sacolas, nos carros da PF. Vou seguir a fórmula. Não há frase final, desfecho pro texto, sacada inteligente, tirada irônica. É assim. Ponto.