terça-feira, maio 03, 2005

Paulo, por Mário.


Li, há algum tempo, uma coluna do Mário Prata no Estadão, falando dele, O Paulo. Agora, meses depois (ou terá sido mais?) esbarrei com ela, a coluna. Deu vontade de reproduzi-la aqui, primeiro porque ele, O Paulo, está novamente na boca do povo, com o lançamento planetário do seu novo livro, O Zahir. Depois porque concordo com ele, O Mário.


O Paulo

Em toda palestra que eu faço, chega uma hora que uma mocinha com uma voz preconceituosa me pergunta o que eu acho do Paulo. Sei que ela espera que eu espinafre com ele. E, para decepção dela, elogio. Quem sou eu para duvidar da capacidade profissional de um brasileiro que já vendeu 20 milhões de livros pelo mundo afora? Sem falar que é o autor predileto da Julia Roberts! Quem me dera que ela lesse uma única palavrinha minha. E o Bill Clinton, que não é nenhum débil, passeava com ele debaixo do braço pela Casa Branca, entre um charuto e outro.

Agora, eleito pela Academia Brasileira de Letras, vejo os colegas dos cadernos de cultura fazerem comentários nada favoráveis ao colega imortal. Colega que recebeu do presidente francês a condecoração máxima dada a um intelectual por aquele país.

Não me cabe discutir a qualidade literária do Paulo. Mas, como escritor, sei mais ou menos a origem do preconceito. No Brasil, escritor não pode ganhar dinheiro. É chamado de mercenário. Me lembro que, falando para estudantes em Campinas, disse que estava recebendo para fazer aquela palestra. Levei porradas ao vivo. Engenheiro pode cobrar por palestras. Médico, pode. Nós, não. Não sei do que eles pensam que vivemos.

Mas voltemos ao Paulo. Vamos começar pelas letras que ele fazia para o Raul Seixas na década de 70. Oito em cada dez músicas do Raulzito têm letra dele. Letras que já passaram para uma nova geração, que delira com o rock daquele músico. Tudo texto do Paulo. Só aquelas letras já bastariam para colocar o Paulo em qualquer academia de letras do mundo. Afinal, o cara nasceu há 10 mil anos atrás.

O que os "críticos" da literatura do Paulo precisam entender é que, se ele foi lido por 5 milhões de brasileiros, você pode ter certeza que 4 milhões leram um livro pela primeira vez. Ou seja, ele está formando um contingente (palavrinha esquisita esta) de novos leitores. Mais ou menos como a criadora do Harry Porter. Ninguém na Academia vendeu mais letras do que o Paulo. Tem gente lá dentro que vende sorrisos plásticos e ninguém fala nada. Sou mais o sorriso de mago do Paulo. Ele é a mosca que pousou na sua sopa, minha filha.

Não conheço o Paulo pessoalmente, mas tenho o maior respeito desde os anos 70. Temos a mesma idade e a mesma formação. Trabalhava na Última Hora quando ele e o Raul estouraram. Fui dos primeiros jornalistas a abrir espaços para aqueles roqueiros, já, na época, olhados meio de lado pelos compositores de esquerda, pelos acadêmicos da USP-PUC. O rock deles deu uma guinada na música brasileira. Tocavam guitarra elétrica (um ultraje ao pudor musical naquele tempo), enchiam a cara e fumavam maconha. Os militares ficavam irritadíssimos com aqueles meninos. E o Samuel Wainer, diretor do jornal, me dizia: página inteira pra eles, página inteira! E, do alto de sua sabedoria, assoviava aquelas músicas todas. Era engraçado.

Paulo Coelho, ao receber uma grana preta da Editora Objetiva há uns cinco anos, profissionalizou o nosso ofício. Fez com que as editoras brasileiras começassem a encarar o livro como um produto de 1 milhão de dólares e não apenas de 10 mil reais. Paulo Coelho deu-nos a dignidade de podermos cobrar pelo nosso trabalho. E, se você acha que isso é ser um mau escritor, que isso é ser mercenário, é porque você não nasceu há 10 mil anos atrás.

Parabenizo a Academia Brasileira de Letras. Aqueles 22 simpáticos velhinhos que votaram no Paulo sabem muito bem o que fizeram pela literatura brasileira.

Se os livros do Paulo são bons ou ruins, depende do ponto de vista e exigência de cada um. Mas que ele é muito melhor que o Saramago (Prêmio Nobel de Literatura), por exemplo, eu não tenho a menor dúvida.